Para conter a onda de desmatamento, que é responsável por até 15% das emissões globais de carbono, as comunidades que vivem e trabalham na região precisam de tecnologia para monitorar e denunciar melhor as atividades insustentáveis.
As soluções tecnológicas existentes têm demonstrado progresso na melhoria do monitoramento e da detecção de problemas ambientais e na facilitação da implementação de medidas eficazes e direcionadas. No entanto, a adoção de tecnologia é baixa entre as comunidades locais na Amazônia. Muitas empresas comunitárias em cadeias de valor emergentes de socioeconomia sustentável - incluindo superalimentos, produtos florestais, cacau e café livres de desmatamento - não têm os meios e a infraestrutura para adotar ferramentas de monitoramento e comunicação digital para monitorar a conservação da floresta e melhorar seus processos de produção.
Com o apoio da Cisco Foundation, em 2021, NESsT lançou uma busca por empresas de tecnologia em estágio inicial que proporcionam meios de subsistência sustentáveis a comunidades carentes e regeneram o meio ambiente.
A chamada aberta identificou empresas de tecnologia com soluções tecnológicas testadas e experimentadas que já estão apoiando ou têm o potencial de apoiar negócios liderados por comunidades na Amazônia para aumentar a produtividade, fortalecer o gerenciamento e a rastreabilidade de dados e reforçar a sustentabilidade de suas cadeias de valor - tudo isso respeitando e integrando o conhecimento tradicional das comunidades envolvidas.
Foto: ManejeBem
As duas primeiras empresas a serem selecionadas - Elysios e ManejeBem - receberam apoio financeiro e orientação para adaptar suas soluções tecnológicas às realidades dos negócios baseados na Amazônia. Cada empresa recebeu aproximadamente R$150.000 em investimento, cobrindo visitas ao local, sessões de treinamento e suporte para acompanhar seu impacto e desenvolver modelos colaborativos que possam ser replicados em toda a região.
A Elysios e ManejeBem oferecem tecnologias que podem ser adaptadas às empresas baseadas na Amazon, ajudando-as e a seus fornecedores a tomar decisões comerciais sustentáveis e a integrar processos regenerativos em suas operações com base em dados em tempo real.
A Elysios desenvolve tecnologias agrícolas inteligentes - cadernos de campo digitais, sensores de monitoramento e plataformas de gerenciamento - que permitem que os produtores registrem e prevejam informações importantes, como padrões climáticos, condições de cultivo e qualidade do solo. Essas ferramentas também facilitam para os produtores a organização e o rastreamento de dados sobre suas plantações e o cumprimento de normas legais e ambientais.
ManejeBem oferece ferramentas integradas para gerenciar recursos de forma responsável, além de treinamento técnico para aprimorar as práticas agrícolas e melhorar a coleta de dados. Suas ferramentas já apoiaram mais de 15.000 pessoas no Brasil.
"Com o apoio da NESsT, ManejeBem conseguiu expandir seu impacto e se posicionar como líder em inovação digital para o agronegócio sustentável. Continuamos empenhados em fortalecer nossas operações e ampliar nossa contribuição para garantir práticas agrícolas mais inclusivas e responsáveis na Amazônia ", "
Frederico Apollo, CEO e CFO da Elysios, também vê a parceria com empresas baseadas na Amazônia como um marco no desenvolvimento da empresa:
"Sem o apoio da NESsT, a implementação de nossa tecnologia na região amazônica não teria sido possível. A maioria das associações e cooperativas extrativistas ainda depende da filantropia apenas para operar e, dependendo da natureza de suas operações, algumas podem sempre precisar desse apoio. Essa iniciativa nos permitiu trazer um sistema utilizado pelas principais indústrias brasileiras, adaptado às realidades e contextos únicos da Amazônia", acrescentou Apollo.
Foto: Coopaflora
Uma das empresas que se beneficiou da implementação de novas tecnologias é a Coopaflora, fundada em 2019 na Calha Norte, no Pará, Brasil. A cooperativa, que entrou para o portfólio NESsT em 2023, reúne mais de 30 comunidades - incluindo grupos indígenas, comunidades quilombolas e assentamentos de reforma agrária - nos municípios de Oriximiná e Alenquer, no Pará, e Nhamundá, no Amazonas.
A missão da Coopaflora é fortalecer os meios de subsistência sustentáveis baseados na floresta e promover a conservação da Amazônia a longo prazo por meio da venda de produtos de origem local e sustentável, incluindo castanha-do-pará, feijão tonka, pimenta em pó, óleo de copaíba e óleo de andiroba. Seu trabalho teve um impacto positivo em 1.200 pessoas de comunidades locais, 30% das quais são mulheres.
NESsT conectou a Coopaflora com a ManejeBem para lançar o projeto Coopatec. O projeto oferece cursos de treinamento para pequenos agricultores que obtêm castanhas-do-pará e outros produtos florestais não madeireiros por meio de aplicativos móveis, incluindo o WhatsApp, além de oficinas agroecológicas e assistência técnica remota. Em apenas alguns meses, 70 produtores se registraram na plataforma do projeto, sendo que mais de 50% usam ativamente seus serviços.
Outra empresa do portfólio da NESsT que obteve acesso a tecnologias adaptadas foi a ASSOAB, que atua na Amazônia brasileira desde 1996.
Com o apoio da Iniciativa NESsT Amazônia, a Associação dos Produtores e Beneficiadores Agroextrativistas de Beruri (ASSOAB) introduziu ferramentas digitais desenvolvidas pela Elysios para gerenciar a produção de castanha-do-pará e atender aos padrões de rastreabilidade exigidos pelos mercados internacionais. Com uma rede de mais de 150 famílias fornecedoras e uma unidade de processamento capaz de processar até 200 toneladas por ano, a ASSOAB agora está fortalecendo sua governança interna e expandindo suas operações para incluir óleos vegetais nativos, diversificando as fontes de renda e agregando valor aos produtos florestais locais.
Com base nesses sucessos, Plantusuma empresa liderada por mulheres e especializada em ingredientes naturais de origem florestal para os setores cosmético e farmacêutico, entrou para o portfólio da NESsT Amazônia em 2024.
Plantus desenvolveu um processo inovador de biotecnologia que aprimora os compostos bioativos em ingredientes de origem vegetal por meio de um processo de fermentação específico para cada planta de sua origem. Ela aplica essa técnica certificada a mais de 30 sementes e frutos amazônicos diferentes em sua unidade de produção em Natal. Os ingredientes de alta qualidade que produz incluem óleos essenciais e à base de plantas, extratos, manteigas e pós, que são vendidos principalmente para mercados internacionais para a criação de cosméticos e produtos farmacêuticos.
Plantus obtém todos os seus ingredientes vegetais da floresta usando métodos de colheita que não desmatam nem prejudicam o ambiente biodiverso. Ao fazer isso, Plantus oferece aos pequenos produtores uma renda justa e estável de fontes sustentáveis. As práticas de fornecimento e coleta da empresa há muito tempo estão enraizadas no conhecimento ambiental e local; o desenvolvimento e a aplicação de processos biotecnológicos inovadores permitiram que a empresa aumentasse a produção, mantendo um rigoroso controle de qualidade e rastreabilidade. Nos últimos três anos, a empresa apoiou mais de 200 famílias de fornecedores.
Foto: ASSOAB © Bruno Kelly
A Iniciativa NESsT Amazônia também conta com o apoio de Apoenaum agronegócio familiar na região do Médio Solimões, na Amazônia. Apoena transforma matérias-primas de origem florestal em produtos de alto valor, como óleos, manteigas e farinhas. Embora a empresa trabalhe com uma variedade de ingredientes naturais, como castanha-do-pará, andiroba, copaíba e pirarucu, seu principal produto é a mandioca(Manihot esculenta), um alimento básico e fonte essencial de renda para muitas famílias. Reconhecendo as dificuldades que as famílias de pequenos agricultores enfrentam para alcançar mercados mais amplos, Apoena desenvolveu uma tecnologia interna para melhorar a segurança, a eficiência e a qualidade do processamento da mandioca, ajudando-as a produzir farinha de qualidade superior.
Foto: Apoena
O modelo da Apoena baseia-se na sustentabilidade comunitária e na preservação do conhecimento tradicional sobre como colher e processar a mandioca. A empresa faz parceria diretamente com as comunidades ribeirinhas, fortalecendo o papel da agricultura familiar na geração de renda e na proteção dos territórios locais.
Como fornecedores da Apoena, os produtores locais podem acessar as máquinas de processamento de farinha da Apoena, que reduzem o esforço físico, ajudam a garantir a qualidade consistente do produto e aumentam sua eficiência e lucratividade. Embora seus equipamentos - que incluem misturadores e processadores de farinha - não sejam novos no mercado, as máquinas da Apoenasão projetadas com materiais prontamente disponíveis. Essa abordagem permite uma fácil replicação com investimento mínimo em comunidades remotas e de baixa renda.
Promovendo relacionamentos justos e de longo prazo com as comunidades agrícolas, Apoena oferece suporte técnico e condições de pagamento sem juros que tornam acessíveis as atualizações tecnológicas. Como parte dessa abordagem, Apoena financiou a construção de uma instalação automatizada de processamento de farinha na comunidade de Catuiri, perto de Tefé, que deve começar a operar em breve. Apoena planeja expandir esse projeto piloto para as outras comunidades com as quais trabalha.
Um aspecto central da assistência da NESsTàs empresas de tecnologia participantes tem sido o apoio aos empreendedores para que adaptem suas soluções digitais aos contextos locais. Esse processo tem se baseado na cocriação, com ferramentas sendo adaptadas por meio de diálogos contínuos com agricultores e produtores locais, respeitando seus ritmos, conhecimentos e ambientes de produção.
Essa abordagem colaborativa garantiu que a tecnologia fosse adotada de forma mais eficaz, apoiando as práticas cotidianas em vez de substituí-las. Além disso, os gerentes de portfólio NESsT trabalharam junto com as empresas para explorar áreas como igualdade de gênero e regeneração florestal ao implementar suas ferramentas tecnológicas.
"Embora as barreiras estruturais permaneçam e a infraestrutura limitada e o acesso à Internet sejam desafios persistentes para as comunidades locais que buscam soluções digitais, programas como o NESsT Amazônia apontam para o que é possível quando a inovação está enraizada no local por meio de um desenvolvimento que é inclusivo, adaptável e alinhado com a saúde de longo prazo da floresta e de suas comunidades", compartilha Tiana Lins, Diretora Nacional NESsT , Brasil.
"Como aceleradora de empresas comunitárias na Amazônia, nossa função vai além da introdução de soluções inovadoras que melhoram a produção e aumentam a renda familiar. Nosso foco é criar as condições necessárias para que essas soluções criem raízes - oferecendo suporte financeiro, orientação e apoio na adaptação de ferramentas aos idiomas e contextos locais, para que os pequenos produtores possam se envolver de forma significativa com a tecnologia.""
Olhando para o futuro, NESsT planeja compartilhar os resultados consolidados do programa, aprofundar a colaboração entre as empresas apoiadas e levar essas experiências a fóruns globais, como a COP30. O objetivo é demonstrar que é possível crescer conservando, inovar honrando o conhecimento tradicional e transformar colocando a floresta e suas comunidades no centro do desenvolvimento.